segunda-feira, 23 de abril de 2012

MONÓLOGO A DOIS

- Se soubesse que alguém chora por você, o que faria?
E se pudesse saber a razão, faria algo pra mudar?
- Não.
- Porque?
- Não é recíproco.
Me convém que chores por mim sem ao menos conhecer-me,
enquanto eu, em devaneios e febres passageiras vivo noite adentro,
e fora, também me desconheço.
- Então, pouco te importas se rio ou se choro quando na verdade tens
a consciência de saber-me amar-te?
- Não. Não tenho consciência. Consciência é de fracos, de sensíveis,
de espirituais, de introspectivos, de amantes que se comprometem demais;
de você.
- Ah... Que dizes se minh’alma sente fugir-se dela a respiração e fundir-se
a mim tamanha desilusão a ouvir-te assim tão fria.
Me cabe a dúvida; onde estás agora?
- Porque?
- Te necessito.
- Não entendo.
- Necessito que sê dê conta deste ser meu que fizeste assim ser. Que me olhe
outra vez nos olhos, e, mesmo que não faças idéia do que é profundidade, deixar-me
ser o intenso que tuas experiências antigas desconhecem.
- Me amas então... Sois sinceridade que meu eu despreza. E conto-lhe, que
não aprendi a valorizar o belo e o que me ofereces.
- Por quê?
- Há vida lá fora. Mundos giram, almas trafegam em ritmo frenético e queres tu
que eu perca tanto momento por somente a eternidade que tens a dar-me?
- Ah, tristeza minha... Se soubesses que teus instantes são os dias em que me encontro
sonhando contigo... São as horas que perco escrevendo-te em mim como
a cicatriz mais viva que me acende na carne e me compraza por tamanha dor...
- Louco! Te comprazes de dor?
- Sim. Que é tua dor... A dor que teu ser distante desperta em mim sempre quando me
deito. A dor que teu sorriso escancarado a qualquer outro me incita a sonhar-te mais comigo,
e a perder-te mais em mim...
- Lamento. Não sei quais foram teus mais puros instintos e intuições a fazer-te enamorado meu, tampouco a razão pela qual teu querer se fez concreto a pensar-me...
- O que dizes?
- Que lamento.
- Lamentas quanto? Se o teu lamentar fosse ao menos proporcional ao que sofro, lembrança minha...
Me farias já o homem mais feliz. Porém, lamentas com a menor das penas, e eu, mereço
muito mais! Mereço que passes ao menos uma noite em claro rindo-te de mim e
acariciando-te o ego por ter-me em tuas mãos como viciado e dependente.
Mereço, amor meu, que tenhas pena de verdade! Que tenhas a dó que tenho tido
eu mesmo de mim. Mereço, talvez, que me queiras (que seja) por compaixão.
- Vês? Por isso não amo! Porque te volves louco, irremediável, cego, humilhado,
incompreendido e só.
Sois tão só, querido... Que tua solidão me desperta a vontade de estar sozinha de ti.
- Teu não e ausência me fazem só. Responde-me!
Se soubesse que alguém chora por ti, o que faria?
- Não sei. Talvez sairia à boemias, beberia, fumaria, estaria distraída com outros seres como eu, iria rir em um cabaré ao som de um piano agonizante... E, em última ocasião, se é extremo
meu tédio, pensaria em quem me chora.
- E o que te falta para pensar em mim?
- O tédio. 
- E não te entedias nunca?
- Como vou a entediar-me, querido, se me procuras, me alivias os cansaços, me aceitas sempre
com o mesmo cheiro a álcool e sono acumulado? Me divertes, me refugias, me alimentas
de seguranças... Não há tédio que me alcance se giras comigo no meu ciclo desdenhoso.
- Assim entendo... Não me queres porque te amo em demasia! Porque quando choras
não me importo com o que tenho eu chorado e corro a fazer-te feliz...
E tenho completado-te inteira de mim e me perdido... Vejo, que há tempos sou
teu céu de estrelas, que me sonhas, que me pensas, e que somente eu, por completo,
não te basta... queres também não possuir-me, não garantir-se de mim,
minha ausência e...
- Ora. Vai-te, que é tarde e alucinas.

Anne Oliveira

sábado, 14 de abril de 2012

OS CINCO MIL ESCONDERIJOS

Quantas cores vejo no negro dos seus olhos!
E o fogo de seu sangue que me queimou… levo cicatrizes por haver te sentido dentro.
Me cale e me tranque a boca. Use as agulhas que encontrou em meu agulheiro; meu silêncio.
Me parta a cara com tuas mãos de papel e me encha o corpo de ar pra que possa
continuar flutuando. Acendi um cigarro com o calor de nossa pele… Que me gritavam me arranhavam, me coloriam e voltei  a ver os seus olhos de sombra.
E me perdi.
Corro pelos cinco mil esconderijos do seu olhar e me desfaço… escorrendo como lagrimas
das vontades partidas.
Não houve palavra, não houve silêncio, não houve você, eu tampouco.
Sigamos descendo pela escada do pecado e descubramos ao final que resulta
na garganta de um inocente diabo que nossas promessas criaram.
Me jurou tudo, e nada. Me jurou que seríamos reais em meio à tanta merda
porem não, não quero estar nem me sentir real. Não quero ser valente.
À você, à tua tortura, à tua loucura; sim quero.
Ver esta tua expressão molhada de mentiras enquanto as engulo, gota a gota…
e nos deixarmos lançados ao nada enquanto tudo segue girando e não sentimos pois
o amor nos dói demasiado  para sentir algo mais.
E eu gosto quando gritas à lua essa nostalgia que também é minha.
Me conte um conto, me apague a luz que já não sei como sonhar.
Nossa ultima canção de ninar foi infernal… que as meninas se tornaram
ladies e nossos Peter’s incharam em uma academia na Avenida Desilusão.
Façamos uma fogueira na porta da Felicidade; queimemos sonhos,
lembranças, dias, luas, caixas, corpos, almas, vozes, violões… Queimemos o
mundo! Vamos ver se nos abre.
E se não, nos deixemos por aqui; onde ninguém nos veja, enquanto choro e você me vê…
Enquanto conto aos filhos que nunca terei, quantos milhares de cores
haviam em seus olhos negros. E como vivi, enquanto morria um pouco mais nos
cinco mil esconderijos do seu olhar.


Anne Oliveira